anterior índice próxima  
encerrar        
        5. MÉTODOS
       


Cruz, Rafael C.; Vilella, Fábio S.; Schwarzbold, Albano; Machado, Nelson A. F., Lopes, Nilson; Cunha, Adriano S.; Bruschi Jr., Willi; Balbueno, Rodrigo A.; Hasenack, Heinrich e Oliveira, Paulo Luiz.

5.1 INFORMAÇÕES E MAPAS BÁSICOS

Hasenack, Heinrich ; Cruz, Rafael C.; Lopes, Nilson; Cunha, Adriano S.; Balbueno, Rodrigo A.; Machado, Nelson A. F. e Bruschi Jr., Willi; Vilella, Fábio S.

Os dados básicos utilizados neste trabalho podem ser divididos em três categorias:
Dados bibliográficos;
Dados cadastrais;
Dados cartográficos.

Os dados bibliográficos foram obtidos em livros, artigos científicos, teses e dissertações, bem como em relatórios técnicos de consultoria, os quais são listados nas referências bibliográficas.

Os dados cadastrais referem-se aos bancos de dados fornecidos pela FEPAM, bem como os bancos de dados de informações disponíveis na Internet ou em meio digital, os quais são referenciados sempre que utilizados ao longo do texto (por exemplo, o banco de dados NEODAT, o banco de dados de informações municipais do IBGE, entre outros).

Os dados cartográficos referem-se às cartas topográficas em escala 1:250.000, 1:50.000, mapas temáticos obtidos junto à FEPAM em meio digital, imagens de satélite, mapas temáticos disponíveis na Internet e aqueles obtidos junto aos órgãos setoriais como o DNPM, por exemplo.

A Tabela 1 apresenta a relação de informações cartográficas utilizadas/consultadas neste estudo.

Para fins de integração de dados em sistema de informações geográficas (SIG), os produtos foram compatibilizados com a base cartográfica em escala 1:250.000 (DSG), com datum SAD69. Desta base foi utilizada a hidrografia de referência e a altimetria. A rede viária foi obtida em meio digital (DAER). A malha municipal atualizada foi fornecida pela FEPAM, de acordo com a base digital 1:500.000 do IBGE atualizada pelo GEOFEPAM. As sedes municipais e localidades rurais foram obtidas das imagens de satélite em conjunto com a base 1:250.000 da DSG.

A localização de barragens existentes foi obtida a partir dos cadastros da FEPAM e da ANEEL, de informações obtidas a campo e a partir de interpretação de composições em falsas cores de imagens do satélite Landsat TM7, com resolução de 15 metros e análise estereoscópica de fotografias aéreas em escala 1:60.000.


Tabela 1. Resumo das informações cartográficas utilizadas no estudo.



A cobertura e uso do solo foi obtida a partir da classificação de imagens do satélite Landsat TM7 para as classes de vegetação arbórea/arbustiva com dossel contínuo, água e áreas não florestais. Dada a heterogeneidade temporal e espacial das imagens disponíveis com pouca cobertura de nuvens, somente apresentaram consistência, para este estudo, as informações referentes às manchas remanescentes de matas.

A cartografia básica foi disponibilizada para a equipe em formatos vetoriais do Autocad, do Carta Linx e do Arc View e no formato raster do IDRISI 32, de acordo com as necessidades.

5.2 ANÁLISE INTEGRADA (MULTI-CRITÉRIO)

Cruz, Rafael C.; Vilella, Fábio S.

A integração das informações contidas nos mapas síntese que representam os diferentes critérios (mapas síntese do ambiente físico, da vegetação, da fauna terrestre, da fauna aquática e do meio antrópico), associadas às informações referentes aos mapas que representam áreas de restrições absolutas, foi efetuada no IDRISI 32 através do módulo de análise multi-critério (MCE: Multi-Criteria Evaluation).

Na codificação referente a este módulo, todos os mapas que representam variáveis contínuas (geo-campos) são chamados de fatores e todos os mapas que representam variáveis booleanas, isto é, que somente assumem valores zero e um, são chamados de restrições.

Para padronização das variáveis indicadoras representadas nos diferentes mapas utilizou-se o módulo Fuzzy do software de informações geográficas IDRISI32. Este módulo contém algoritmos para transformação das variáveis para uma nota padronizada. No caso utilizou-se a escala em bytes (0-255). No ANEXO 12.1 apresentam-se as transformações que podem ser utilizadas.

Os mapas restrições funcionam como máscaras que excluem da análise todas as áreas nas quais, por algum motivo, não é possível a instalação de empreendimentos hidro-energéticos. Neste trabalho foram consideradas como áreas de exclusão as definidas em lei, como as Unidades de Conservação e Terras indígenas. Nas áreas restantes, onde existe a possibilidade de instalação destes empreendimentos, os mapas fatores hierarquizam as áreas, de acordo com a média ponderada e, opcionalmente, com a ponderação do ordenamento (ranking) das células produzido pela média ponderada. Esta última opção (de ordenação pela média) permite que se possa efetuar um certo gerenciamento de risco. Ao se atribuir pesos iguais para as diversas classes de ordenamento das células, o resultado equivale à aplicação da média ponderada dos fatores. No entanto, ao se atribuir pesos maiores ou menores para os mais ou para os menos ordenados, desvia-se a resultante para uma solução mais ou menos conservativa. Se a variável refere-se à favorabilidade para o empreendimento, então a solução mais conservativa é resultante de atribuir-se pesos maiores às piores ordenadas. Se a variável refere-se à fragilidade do ambiente, então a solução mais conservativa é resultante de atribuir-se pesos maiores aos melhores ordenados, isto porque quanto maior o valor da fragilidade, maior o grau de restrição.

De acordo com a Comissão Mundial de Represas (CMR, 2000), a maior parte da polêmica contida no processo de tomada de decisões refere-se à obtenção do vetor de pesos atribuídos para os diferentes critérios na análise multi-objetivo. Nesta fase do processo existe a possibilidade de conflitos de visões de mundo ou de interesses diferenciados. Neste momento, os inúmeros métodos de atribuição de pesos disponíveis podem auxiliar os coordenadores de projetos a resolver conflitos. O Manual de Inventário da Eletrobrás (ELETROBRÁS, 1997) sugere a aplicação do Método de Análise Hierárquica proposto por SAATY (1977, in EASTMAN, 1999), que envolve a construção de uma matriz de comparações pareadas entre todos os critérios a serem ponderados. A ponderação resultante da obtenção do autovetor de maior valor, uma vez normalizado, estabelece uma composição de pesos ótima. Quando o consenso não é possível para atribuição de comparações entre dois critérios, é sugerida a utilização dos valores médios de vários avaliadores. Este algoritmo está implementado no software livre SPRING, fornecido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (http://www.dpi.inpe.br/spring/), bem como no módulo WEIGHT do IDRISI32. Observa-se, entretanto, que os formulismos não dispensam o necessário consenso interdisciplinar. Este pode ser alcançado somente através do debate efetivo entre os diversos membros da equipe técnica e de um processo iterativo. A utilização de esquemas de objetivação baseados nestes formulismos, se não inserida dentro de um esquema iterativo que garanta a construção do consenso interdisciplinar, pode resultar em modelos que não representam adequadamente a realidade, colocando em risco de fracasso todo o processo decisório. Isto pode ocorrer porque a solução pode preservar a otimização quantitativa, mas não a qualitativa de cada critério.

Neste estudo, o método empregado foi baseado na elaboração iterativa de modelos e construção do consenso interdisciplinar. O procedimento parte da elaboração de modelos tomando-se como ponto de partida o modelo elaborado com o vetor de pesos iguais para os fatores. Além disso, também foram elaborados modelos em que alternadamente foram atribuídos pesos maiores para os critérios bióticos, antrópicos e físicos (Tabela 4). O produto destes modelos foi submetido à equipe técnica, para a avaliação da consistência dos mesmos, considerando a experiência da equipe, os dados de campo e as informações disponíveis. Também foram avaliadas as modificações dos resultados de acordo com a sensibilidade do modelo aos diferentes critérios. Com base nesta análise, foram propostas novas composições de pesos, os quais geraram novos modelos, em um processo iterativo que somente se encerrou com a obtenção de um vetor de pesos que fosse produto do consenso da equipe.
Todos os modelos foram gerados para quatro cenários (Tabela 3), os quais representam a situação atual e futura da fragmentação da rede de drenagem, considerando-se a implantação ou não da UHE Garabi. Os cenários incluíram a incerteza quanto à implantação da UHE Garabi porque o rio Uruguai é de domínio da União, sendo o empreendimento, também, binacional (Brasil-Argentina). Caso seja implantada, esta represa alterará todo o sistema de conexão de rios livres entre o rio Uruguai e os rios da bacia 75.

O vetor de pesos resultante foi, então, aplicado juntamente com outros vetores de pesos para classes de ordenamento, de modo que fossem obtidos, além do cenário resultante da média ponderada, um cenário mais restritivo e outro mais permissivo para o mesmo vetor de pesos para os fatores (Tabela 5).

Estes cenários foram, então, submetidos à FEPAM, juntamente com a avaliação de qual deles é mais adequado, do ponto de vista da equipe técnica.

Definido pela FEPAM o cenário a ser utilizado, as opções de barramentos foram então avaliadas de acordo com este cenário, tomando-se para isto a hierarquização das fragilidades ou favorabilidades obtidas a partir da extração da fragilidade ou favorabilidade média para as áreas de influência direta dos empreendimentos ou para as áreas inundadas. Este procedimento foi efetuado através do módulo EXTRACT do IDRISI32.

Os empreendimentos que estiverem projetados em áreas excluídas (valor zero no mapa do cenário escolhido) não devem ser licenciados, por princípio. Os empreendimentos que estiverem projetados em áreas que apresentam valores não nulos deverão ser avaliados de acordo com a hierarquia produzida e com a configuração de empreendimentos que resulte em menor somatório de fragilidades ou máxima favorabilidade, considerando-se o seu efeito na fragmentação da bacia hidrográfica.

5.2.1 Geração de mapas-síntese por bloco temático

Os dados extraídos das diversas bases georreferenciadas foram sintetizados para expressar as favorabilidades para implantação de empreendimentos hidrelétricos, de maneira que o conjunto de variáveis fosse reduzido, facilitando a visão do conjunto das variáveis indicadoras. Este processo envolveu, por exemplo, a síntese dos mapas de hábitats de todas as espécies de interesse especial de peixes, que foram mapeadas (66 espécies) em um único mapa.

Além desta síntese processada dentro de cada disciplina, que resultou em 19 mapas, dos quais 17 representam geo-campos reclassificados para escala de bytes e 2 representam mapas de restrições, foi efetuada uma nova síntese por blocos temáticos, efetuada através de uma combinação linear ponderada no módulo MCE do IDRISI32. A Tabela 2 apresenta a relação entre os blocos temáticos e os mapas que os originaram com as devidas ponderações dentro de cada bloco (os pesos dentro de cada bloco devem somar 1,0).


Tabela 2. Blocos temáticos.


Observa-se que o mapa de trechos de rios livres define os quatro cenários que foram ensaiados, envolvendo uma combinação de dois critérios: a temporalidade (atual ou 'futuro, considerando no cenário futuro a construção de todas as barragens inventariadas) e a localização do ponto de partida da medição dos tamanhos de segmentos de rios livres de represas em relação à sustentabilidade de populações de peixes migradores (Tabela 3).


Tabela 3. Cenários definidos para o critério de trechos de rios livres.


O critério fisiográfico definiu como ponto de partida para medição dos comprimentos de trechos de rios a foz do rio Icamaquã e a cidade de Garruchos, estabelecendo três cortes fisionômicos para o rio Uruguai: trecho médio (Campanha), trecho de transição (entre a foz do Icamaquã e Garruchos, ou transição Planalto/Campanha) e rio de planalto (todo o rio à montante de Garruchos). Para o caso da UHE Garabi foi adotada a cota de inundação de 94 metros de altitude.

Desta forma, foram gerados quatro mapas do meio aquático refletindo os quatro cenários definidos para os trechos de rios (Tabela 3).

Estes mapas do meio aquático representam, nesta metodologia, os únicos critérios que avaliam os efeitos cumulativos e sinérgicos sobre a rede fluvial, em especial a fragmentação da rede fluvial, da qual os peixes migradores são excelentes indicadores.

5.2.2 Operacionalização da análise multi-critério

A análise multi-critério foi efetuada utilizando-se o módulo MCE do IDRISI32, utilizando-se a opção de ordenação da média ponderada. A Figura 5 apresenta a tela de entrada do módulo MCE com um exemplo. Neste caso existem dois mapas booleanos que representam restrições (constraints) e quatro mapas de geo-campos que representam fatores (factor). Os pesos dos fatores estão definidos à direita do nome dos arquivos. Os pesos definidos para o ordenamento das médias ponderadas dos fatores estão expressos em quatro classes de ordenamento com seus respectivos pesos (order weights). No exemplo os pesos são iguais, resultando em uma saída igual à combinação linear ponderada. Quando os fatores expressam fragilidades, e deseja-se gerar um cenário mais conservativo, atribui-se pesos maiores para as médias ponderadas melhor ordenadas, ou seja, à direita na caixa de entrada. Como neste estudo as variáveis foram adotadas como favorabilidade para implantação de barragens, o procedimento é inverso. O cenário mais conservativo deve dar mais peso para as classes situadas à esquerda da caixa de entrada.


Figura 5. Caixa de entrada do módulo MCE (multi criteria evaluation) do Idrisi32.

Considerando-se os quatro cenários estipulados, foram definidas composições de pesos para fatores e para cenários conservativos, normais e permissivos, os quais estão expressos nas Tabelas 4 e 5.

Tabela 4. Pesos dos blocos por cenários adotados para avaliação da sensibilidade do modelo de avaliação multi-critério - pesos dos blocos em cada cenário.


Tabela 5. Pesos para as classes de ordenamento das médias ponderadas para os modelos permissivo, normal e conservativo.



5.3. CRITÉRIOS RELATIVOS AO MEIO ANTRÓPICO

Lopes, Nilson; Cruz, Rafael Cabral

As barragens, para a geração de energia ou para outras finalidades, são empreendimentos de infra-estrutura que se configuram em importante suporte para os processos de desenvolvimento sócio-econômico. Em conseqüência, independente do agente investidor, estes assumem a condição de empreendimentos de interesse público, vinculados aos processos de organização e planejamento, estando inseridos nos processos de desenvolvimento de âmbito nacional, regional e local. Portanto, a justificativa para a construção de barragens é dada, ou deveria sê-lo, por estudos e projetos de interesse coletivo. Os inventários do potencial energético dos rios da bacia 75 produzidos pela CEEE e CERILUZ, objetos da análise deste estudo, inserem-se no âmbito da política nacional de geração de energia, sendo parte importante do planejamento energético estratégico do país. Conforme a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), o mercado de energia cresce a uma taxa de 4,5% ao ano, devendo superar 100 mil MW em 2008 (http://www.aneel.gov.br/39.htm). Portanto, em termos globais e estritamente sócio-econômicos, o uso do potencial energético dos rios avaliados ancora-se na necessária expansão da matriz energética brasileira que, em última análise, visa garantir a oferta de energia para a manutenção e ampliação do processo de desenvolvimento nacional e, conseqüentemente, regional.

A principal característica sócio-ambiental dos projetos de barramento para geração de energia elétrica relaciona-se à dicotomia entre os benefícios globais gerados pela disponibilidade de energia e os impactos ambientais localizados. Enquanto o benefício, ou a energia elétrica abrange o território regional ou nacional, os impactos negativos atingem as populações locais e microrregionais. Os projetos voltados ao atendimento de demandas e necessidades energéticas microrregionais ou locais reproduzem essa dicotomia, em uma escala de valoração e percepção social menor. Portanto, mesmo diante de aspecto positivos (abastecimento, contenção de cheias, etc.) para as sociedades locais (município) ou microrregionais (conjunto pequeno de municípios) ainda assim ocorrem impactos negativos pontuais e localizados, ou seja, o que muda é a escala de análise.

O resultado empírico desse descompasso entre o local de produção da energia e o local de consumo resulta na produção de efeitos sócio-espaciais diferenciados e em contradições entre o direito à qualidade ambiental e a necessidade estrutural de acesso à energia, ambos fatores condicionantes do bem estar individual e social. O desafio colocado para o setor de produção de energia e, sobretudo, para as instituições responsáveis pelo licenciamento ambiental dos empreendimentos, encontra-se no equacionamento desses aspectos que, em última análise, possuem um caráter público e estão inscritos no campo dos direitos sociais e das necessidades fundamentais.

A experiência e o acúmulo de estudos de caso demonstram que na construção de barramentos, entre um conjunto de impactos negativos ao sistema sócio-espacial local e microrregional, os principais impactos relacionam-se com a necessidade de remoção populacional e a perda de patrimônio ambiental e cultural (paisagens, sítios arqueológicos e obras de arte com valor histórico). Entre os impactos positivos destacam-se os ganhos relativos a infra-estrutura básica necessária ao processo de desenvolvimento. Entretanto, o conhecimento e a avaliação dos impactos resultam dos Estudos de Diagnóstico Ambiental e dos respectivos Relatórios de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), realizados caso a caso. Nesses estudos é possível, através da mediação teórica, considerar a singularidade do empreendimento e da interação desse com a singular realidade local.

Em estudos de pré-avaliação, o procedimento da escolha de variáveis pauta-se pelo caráter universal da mesma, isto é, independente das singularidades locais. O efeito esperado sobre o fator, indicado pela variável, em tese, é o mesmo em todos os contextos sócio-espaciais.

Para a definição das variáveis sócio-espaciais utilizadas nesse trabalho, além dos aspectos citados, foi considerado o fato de que as mesmas necessitam ser espacializáveis. A partir da utilização das ferramentas de computação disponíveis, sobretudo os sistemas de informações geográficas (SIG), é possível espacializar todo e qualquer dado estatístico. Entretanto, a partir do levantamento e análise crítica das bases de dados sócio-econômicos disponíveis (FEE, IBGE, INCRA, CEEE, Base de Dados Municipais, Cartografia Oficial), verificou-se que, em função da escala de trabalho, uma série de indicadores largamente utilizados nos estudos de impacto ambiental não são adequados aos objetivos desse trabalho. Sendo assim, optou-se pela utilização de variáveis do meio antrópico sujeitas a uma quantificação e identificação objetiva, sem a necessidade da mediação teórica. Esses indicadores estão inscritos, principalmente, no uso e ocupação do solo, que nada mais são do que o reflexo da ação e organização humana necessária para o uso dos recursos naturais disponíveis no contexto da unidade de análise, neste caso, o conjunto de municípios inseridos na bacia hidrográfica. Para os objetivos deste trabalho foram selecionados onze fatores sócio-econômicos adequados à construção de critérios antrópicos indicadores de fragilidades ambientais no contexto da bacia hidrográfica. Entretanto, em decorrência da escala de trabalho adotada (1:250.000), somente seis foram utilizados. A seguir apresenta-se uma breve descrição do tipo de informação que os critérios selecionados possibilitam.

5.3.1 Variáveis Selecionadas e Utilizadas

Função de marco territorial dos rios
O pressuposto para utilização desse critério é dado pelo fato de que quanto maior o número de unidades territoriais impactadas pelo barramento, maiores são as possibilidades de conflitos de interesse sobre os usos da água e também mais significativos são os impactos sobre a gestão territorial. Na Tabela 6 estão apresentadas as pontuações atribuídas a cada um desses critérios.

Tabela 6. Pontuação para os rios que estabelecem marcos de fronteiras: municipais, estaduais ou internacional.


Infra-estrutura básica de transporte

As modificações decorrentes do enchimento do lago sobre equipamentos de infra-estrutura de transporte, neste caso exclusivamente sobre estradas, e, sobretudo, em cursos de navegação, implica em impactos negativos que agem de forma cumulativa sobre os arranjos sócio-espaciais e nos fluxos e trocas econômicas em âmbito local, regional ou internacional. Uma via secundária para trânsito local não apresenta as mesmas implicações em impactos como uma via com função de escoamento regional ou internacional. Por isso, são aplicadas pontuações diferentes conforme a função econômica da estrada. Na Tabela 7, estão apresentadas as pontuações referentes a cada um desses critérios.

Tabela 7. Pontuação para as implicações diretas em vias rodoviárias.


Proximidade de áreas urbanas ou urbanizadas (povoados)

A proximidade entre barragens e áreas urbanas, sobretudo as de grande porte, não são tecnicamente recomendadas, a menos que a função da mesma seja para proteção de cheias. Dentre um conjunto de fatores, aparecem como os mais importantes: os riscos de acidentes; a pressão antrópica para ocupação irregular das áreas de preservação permanente do lago e a imposição de limitações ao ordenamento urbano. A alteração do regime hídrico também implica em problemas para as áreas urbanas: menor capacidade de diluição de esgotos e efluentes industriais, disseminação de zoonoses (leptospirose, por exemplo) e alteração nos poços tubulares (artesianos).

Assim como para os outros indicadores, para esse, também, foram estabelecidas pontuações diferentes determinadas pela distância transversal ao perímetro das áreas urbanas, no caso de áreas urbanas poligonizadas, e um raio, no caso de áreas urbanas caracterizadas como ponto. Quanto mais próximo do centro urbano, maior a possibilidade de interferência (impactos). Na Tabela 8, estão apresentadas as pontuações referentes a cada um desses critérios.

Tabela 8. Pontuação para proximidade de áreas urbanas.


Pressão fundiária sobre os recursos naturais
Entende-se que, quanto maior o número de propriedades e população atingidas, maior o impacto sobre a organização comunitária e para os núcleos familiares. Esse é, seguramente, um dos impactos negativos resultante da construção de barragens que mais significativamente atua sobre o meio antrópico.

Na escala adotada para regionalização de impactos e hierarquização de alternativas, a probabilidade de impactar propriedades e populações rurais foi avaliada a partir da construção do Índice de Pressão Fundiária sobre os Recursos Naturais. Este índice foi composto a partir das seguintes informações: a estrutura fundiária e o módulo fiscal do INCRA. A estrutura fundiária foi avaliada com base nos dados do IBGE (SIDRA). Em casos em que o município avaliado foi emancipado posteriormente à obtenção do dado, foram utilizados os dados do município de origem.

Considerou-se que a estrutura fundiária expressa melhor a população permanente na área rural em relação aos dados de população, uma vez que o censo inclui a população temporária na totalização da população rural. O módulo fiscal foi utilizado para relativizar o impacto da fragmentação fundiária sobre os recursos naturais. Considerou-se que o módulo fiscal expressa o tamanho de propriedade que garante a exploração sustentável social e ambientalmente. Dessa forma, se uma propriedade é menor que o módulo fiscal, estará pressionando os recursos acima da linha de sustentabilidade, se for maior, estará subtilizando os recursos disponíveis. Uma estrutura fundiária concentrada próximo ao tamanho do módulo estará dentro de padrões de sustentabilidade.

O Índice de Pressão Fundiária sobre os Recursos Naturais (IPFRN) foi calculado para cada município da seguinte forma:

1. Identificou-se qual a classe de tamanho de propriedade que contém o módulo fiscal (MOD) nos dados de área total por tamanho de propriedade.
2. Para cada município, somou-se a área de todas as classes de tamanho menores que a classe que contém o módulo fiscal (<MOD).
3. Procedeu-se de modo similar para as classes maiores (>MOD) que a classe que contém o módulo fiscal.
4. Obteve-se a área rural total do município somando-se a área de todas as classes.
5. Calcularam-se os valore relativos de <MOD, MOD e >MOD, dividindo-os pela área rural total, obtendo-se P<MOD, PMOD e P>MOD.
6. Estabeleceram-se pesos para a proporção de área dos municípios contidas em P<MOD, P=MOD e P>MOD. Os pesos foram:

P<MOD P=MOD P>MOD
0,6 0,3 0,1


Assim,
IPFRN = (P<MOD * 0,6) + (P=MOD * 0,3) + (P>MOD * 0,1)

As Tabelas 9 e 10 apresentam o cálculo do IPFRN para o Município de Ajuricaba tomado como exemplo.
O valor de IPFRN é diretamente proporcional à noção de fragilidade. Para expressar favorabilidade para instalação de empreendimentos ele deve ser transformado de forma inversamente proporcional de modo que os valores mais altos expressem os melhores locais para barramentos. Este procedimento foi efetuado no módulo FUZZY, incluindo-se o reescalonamento para escala de bytes (0-255).

Tabela 9. Cálculo da Proporção da área rural do Município de Ajuricaba na classe de tamanho de propriedades rurais.

Fonte: Censo Agropecuário, 1996 (IBGE, 1998) e INCRA.

Tabela 10. Cálculo do IPFRN para o Município de Ajuricaba.



Interação com populações e terras indígenas e quilombos
O uso desse indicador aponta para incompatibilidades legais e para geração de conflitos. Ao contrário dos outros critérios esse fator indica uma restrição absoluta que foi expresso pela produção de um mapa booleano.

Unidades de Conservação
As unidades de conservação, em decorrência da legislação, tornam-se restritivas, pois a construção de barragens ou seu impacto direto sobre essas áreas não é permitida. Assim, como no critério anterior, também foi produzido um mapa booleano para esse critério.

5.4 CRITÉRIOS RELATIVOS AO MEIO BIÓTICO TERRESTRE

Cunha, Adriano S.; Balbueno, Rodrigo A.; Oliveira, Paulo Luiz


5.4.1 Vegetação

Balbueno, Rodrigo A.; Oliveira, Paulo Luiz

O levantamento das espécies arbóreas ocorrentes na sub-bacia 75 e na bacia do Alto Uruguai foi realizado através de consulta bibliográfica e visita a alguns rios (pertencentes à sub-bacia 75). Optou-se por considerar apenas as espécies arbóreas* pelos seguintes motivos:

1. As matas ciliares são prioritárias na abordagem em questão, em função do seu papel indicador na avaliação da funcionalidade do sistema ripário, incluindo a estabilidade geomorfológica do leito do rio e a conectividade, considerado o contexto de uma paisagem antropizada e fragmentada onde os principais remanescentes estão associados às áreas ripárias;
2. As espécies arbóreas são definidoras das formações florestais, ou seja, são definidoras da estrutura das matas, que por sua vez são os ambientes preferenciais da maioria das espécies de fauna ameaçadas de extinção;
3. Possibilidade de espacializar as informações, uma vez que somente foi possível distinguir, nas imagens de satélite, as classes água, floresta e áreas não florestadas, dada a heterogeneidade temporal e espacial muito grande das inúmeras cenas necessárias para cobrir toda a área em estudo;
4. As informações disponíveis referem-se predominantemente às espécies arbóreas. Sobre as demais formações vegetais as informações são fragmentadas e, portanto, insuficientes para uma espacialização adequada às finalidades do estudo.

* O xaxim (Dicksonia sellowiana) foi incluído, mesmo não sendo uma árvore, por ser uma pteridófita arborescente indicadora de qualidade ambiental e ainda uma espécie ameaçada de extinção.

Da lista geral das espécies arbóreas, foram destacadas aquelas consideradas ameaçadas de extinção, de acordo com a lista divulgada pela SEMA/RS (Rio Grande do Sul, 2003). O que motivou a escolha dessas espécies foram os critérios legais e a disponibilidade de informações. Outras espécies de interesse especial, como as de interesse econômico, medicinal, cultural e paisagístico, não constantes desta lista, não foram incluídas em função da inexistência de informações sistematizadas e passíveis de avaliações espaciais na escala de trabalho adotada.

A distribuição geográfica das espécies arbóreas ameaçadas, no âmbito das sub-bacias consideradas, foi obtida através da avaliação da potencialidade de ocorrência a partir das seguintes situações de ocorrência:

Grupo 1 - Espécies da Floresta Ombrófila Mista (Mata com Araucária, acima da cota 800 metros);
Grupo 2 - Espécies da Floresta Estacional Decidual (Mata do Alto Uruguai, cota inferior a 500 metros);
Grupo 3 - Espécies ocorrentes na zona de contato entre as duas formações vegetais anteriores (altitudes entre 500 e 800 metros);
Grupo 4 - Espécies exclusivas das regiões de baixa altitude na região fisiográfica das Missões.

Os dados de ocorrência foram obtidos a partir da análise da seguinte bibliografia: BACKES & NARDINO (1998), BACKES & IRGANG (2002), BRACK. et al. (1985), KLEIN (1972), RAMBO (1956), REITZ et al. (1983).

A espacialização das espécies dos quatro grupos foi obtida cruzando-se as informações altitudinais obtidas das cartas do Exército em escala 1:250.000, com o plano de informações de cobertura florestal obtido por classificação de imagens do satélite Landsat TM7. Desse modo, obtiveram-se quatro mapas de distribuição, um para cada grupo. Os mapas das distribuições de cada espécie foram definidos a partir desses quatro mapas iniciais.

A pontuação das espécies ameaçadas, para fins de análise multi-critério, foi baseada nos critérios de endemismo e status de conservação (restrito à categoria vulnerável, única encontrada para as espécies constantes da lista elaborada para este estudo). Não foi encontrada nenhuma espécie que fosse tanto endêmica quanto vulnerável. Deste modo, considerando-se a avaliação de que o endemismo é mais importante que a vulnerabilidade para os fins deste estudo, o grupo decidiu atribuir peso 0,6 para endemismo e 0,4 para vulnerabilidade. As Tabelas 11 e 12 apresentam as notas para cada um dos critérios.

Tabela 11. Pontuação de acordo com o endemismo das espécies arbóreas ameaçadas de extinção.



Tabela 12. Pontuação de acordo com a vulnerabilidade das espécies arbóreas ameaçadas de extinção.

A partir da definição dos pesos, foi atribuída a nota respectiva de cada espécie, através da reclassificação em sistema de informações geográficas, para cada um dos mapas dos grupos de distribuição geográfica (Tabela 13).


Tabela 13. Pontuação das espécies arbóreas e sua transformada em escala de bytes (0-255).



Dessa forma, obtiveram-se os mapas de distribuição das espécies arbóreas ameaçadas ponderadas pelo seu valor conservativo. A média ponderada dos mapas por espécies aproxima o valor conservativo médio potencial dos hábitats florestais na área de estudo.

5.4.2 Fauna terrestre

Cunha, Adriano S.

A abordagem metodológica empregada para a elaboração dos mapas temáticos, relacionados à fauna, teve como diretriz básica a definição de trechos de margem dos rios presentes na área de estudo que tivessem maior importância para a conservação dos grupos animais. Este estudo efetuou-se através da aplicação de ferramentas de comparação entre as diferentes áreas, em que foram consideradas as ocorrências potenciais das diferentes espécies animais, sendo, também, consideradas as particularidades ambientais de cada porção avaliada, uma vez que o estado dos hábitats é um dos principais definidores da ocorrência de qualquer grupo faunístico.

Considerando-se a enorme quantidade de espécies animais e o grau de desconhecimento sobre as particularidades de todas elas, tanto em termos de biologia como de distribuição geográfica, foi definido que seriam incluídas nesse estudo apenas as espécies animais presentes na Lista Oficial de Espécies Animais Ameaçadas no Estado do Rio Grande do Sul (MARQUES et al., 2002). Além de possuírem grande importância para a conservação e merecerem destaque quando o interesse é a manutenção da biodiversidade, essas espécies podem ser consideradas bons indicadores de qualidade ambiental. Neste estudo, se adota como premissa a hipótese de que a caça ilegal não representa atualmente um grande problema para a conservação das espécies, podendo-se considerar que a maioria dos taxa incluídos na referida lista está ameaçada em função da degradação de seus hábitats. De acordo com THORNABACK & JENKINS (1982), a maior ameaça à fauna brasileira está relacionada à destruição dos biomas Mata Atlântica e Floresta Amazônica, nos quais as áreas florestais são substituídas por lavouras e pastagens. Segundo FONSECA et al. (1994), algumas espécies encontram-se em declínio por que são consideradas nocivas as criações domésticas e por isso exterminadas, enquanto outras são caçadas para consumo da carne ou ainda por diversão.

Certamente as espécies sob ameaça de extinção apresentam maior sensibilidade a perturbações ambientais e menor capacidade adaptativa, muitas vezes sucumbindo diante das mudanças no seu ambiente ou em conseqüência da competição com espécies exóticas com maior plasticidade que invadem seu território, como o mexilhão-dourado (DARRIGRAN, 1998) ou a rã-touro.

Dentro desse contexto, é correto supor-se que a manutenção dessas espécies em determinadas áreas indicaria que tais áreas encontram-se em bom estado de conservação, ou pelo menos que seus ambientes ainda mantêm condições de suportar espécies mais exigentes. Isso vai ao encontro das teorias consagradas entre os que atuam em conservação, que afirmam que a manutenção de "espécies guarda-chuva" (umbrella species, conforme a denominação encontrada na literatura internacional) em determinadas áreas garantiria também a preservação de uma grande comunidade associada ao seu ambiente. Essas espécies atuariam como carros-chefe, garantindo a conservação de muitas outras menos atraentes aos olhos humanos ou até mesmo desconhecidas da grande maioria das pessoas.

Definido o grupo de espécies a considerar, passou-se a uma segunda fase, em que foram excluídas as espécies que sabidamente não ocorrem na bacia do rio Uruguai. Em primeiro lugar foram eliminadas as espécies endêmicas da Planície Costeira do Rio Grande do Sul, como os tuco-tucos (Ctenomys spp.), por exemplo. Aves marinhas ou associadas à faixa litorânea, mesmo não endêmicas, foram também excluídas nessa filtragem.

Numa terceira fase foi iniciada a coleta de dados sobre as áreas de ocorrência das espécies restantes, onde se pode definir que algumas estavam limitadas a zonas de banhado da porção sul do Estado ou que não apresentavam registro ao norte da serra do Sudeste, estando limitadas à Metade Sul.

As principais fontes de dados utilizados nessa etapa foram os acervos das principais instituições de pesquisa de zoologia do Estado, que são a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o Museu de Ciência e Tecnologia da Pontifícia Universidade Católica e o Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica.

Nesse ponto do trabalho, o total de espécies consideradas era de aproximadamente 120 taxa, incluindo diversos grupos de invertebrados e também os peixes. Por ter sido utilizada a ictiofauna como critério de avaliação da integridade do ecossistema (conforme item 6.5 - Meio Biótico Aquático), considerou-se que os outros grupos de hábitos aquáticos ainda presentes na lista, moluscos e crustáceos, não somariam informação significativa, principalmente dada a carência de dados de sua distribuição.

Os dados disponíveis sobre os demais grupos de invertebrados, onde se destacam os insetos, são escassos e de pouca qualidade. Além de problemas com relação à sistemática, esses grupos não contam com pesquisas atualizadas sobre as suas áreas de distribuição. Além disso, as suas relações ecológicas e as conseqüências das alterações em seus ambientes não são conhecidas. Como resultado dessas constatações, o universo de estudo ficou reduzido às espécies de vertebrados terrestres, assim dividido: uma espécie de anfíbio, quatro de répteis, 60 de aves e 24 de mamíferos.

A partir da definição dessa listagem, passou-se a demarcação das áreas de ocorrência desses animais a partir dos registros de coleta ou avistamentos disponíveis em literatura especializada e nos acervos das instituições citadas anteriormente, além de outras como as universidades de Ijuí, de Erechim, de Santa Cruz do Sul e de Caxias do Sul. Foram ainda consideradas as informações obtidas junto à equipe de zoólogos responsáveis pela elaboração do Livro Vermelho de Espécies Ameaçadas, que possuem um banco de dados atualizados sobre distribuições geográficas das espécies da Lista.

A bibliografia empregada no reconhecimento e considerações sobre a distribuição geográfica e história natural das espécies da fauna foi a seguinte:

Anfíbios: Braun & Braun (1980) e HADDAD & ABE (1999);
Répteis: LEMA (1989, 1994), LEMA & FERREIRA (1990), PETERS & DONOSO-BARROS (1970), PETERS & OREJAS-MIRANDA (1970), OLIVEIRA & DI-BERNARDO (1996), MORATO (1995) e DI-BERNARDO (1998);
Aves: BELTON (1994), BENCKE (2001), BENCKE & KINDEL (1999), BENCKE et al. (2000), COLLAR et al. (1994) e SICK (1997);
Mamíferos: EISENBERG & REDFORD (1999 a, b).

A partir dos dados de ocorrência foi possível elaborar mapas de distribuição de todas as espécies de interesse e então realizar as filtragens definitivas da lista. Como o objetivo básico deste trabalho é definir trechos dos rios cujas margens tenham maior ou menor importância para a conservação da diversidade faunística, fazendo-se uma análise comparada entre as zonas da bacia do Uruguai a montante da cidade de São Borja, as espécies presentes em toda a área de estudo e que ocorrem em diversos tipos de ambientes, não serviriam como ferramenta comparativa, uma vez que podem estar presentes em todos os trechos, e foram descartadas. Outras, como a jaguatirica (Leopardus pardalis), por exemplo, que apresenta ampla distribuição mas ocorre associada a áreas florestadas com grande extensão, tiveram seus mapas de ocorrência associados aos mapas de vegetação, ficando limitadas aos maiores fragmentos de floresta. Em função da resolução das imagens disponíveis, o tamanho mínimo dos fragmentos considerados foi de 50 ha.

Paulatinamente, foram sendo sobrepostos mapas de distribuição de todas as espécies, resultando em um mosaico em que alguns pontos eram cobertos por dezenas de mapas enquanto outros, geralmente na parte sudoeste da área de estudo, apresentavam menor número de registros.

Iniciou-se então a fase de valoração das áreas, a partir do arbitramento de valores com relação a cada espécie, considerando dois fatores ecológicos: a necessidade de hábitat e a vulnerabilidade. A necessidade de hábitat refere-se ao tipo de ambiente utilizado pelos animais e a maior ou menor adaptabilidade a variações na qualidade desses. Como a região de estudo apresenta um grau acentuado de substituição de florestas por áreas abertas, aquelas espécies de hábitos estritamente florestais receberam a maior pontuação, enquanto que outras que ocorrem em áreas abertas e conseguem manter-se mesmo em zonas de pastagens e culturas receberam a menor pontuação. A vulnerabilidade foi definida de acordo com a Lista Oficial de Espécies Ameaçadas, que as classifica em "vulneráveis", "em perigo" ou "criticamente em perigo". As Tabelas 14 e 15, apresentadas abaixo, apresentam os valores adotados de acordo com cada critério estabelecido.

Tabela 14. Pontuação de acordo com a necessidade de hábitat (fauna terrestre).


Tabela 15. Pontuação de acordo com vulnerabilidade da espécie (status de conservação - fauna terrestre).


A partir dos dois valores foi obtida a média aritmética, que passou a ser o valor de conservação de cada espécie, sendo inserido no programa gerador dos mapas temáticos. O somatório dos valores de cada polígono de uma espécie resultou então na valoração de cada ponto da área de estudo, definindo de uma forma comparativa aqueles pontos em que a ocorrência de espécies de interesse é mais importante. A Tabela 16 apresenta o esquema de pontuação já em escala de bytes.

Tabela 16. Esquema de pontuação do hábitat e do status de conservação das espécies da fauna terrestre e sua transformada em escala de bytes (0-255).


5.5 CRITÉRIOS RELATIVOS AO MEIO BIÓTICO AQUÁTICO

Vilella, Fábio S.; Bruschi Jr., Willi

5.5.1 Diagnóstico da riqueza de espécies de peixes

Vilella, Fábio S.; da Silva, José Francisco P.

O conjunto de espécies que ocorre na área de estudo foi inventariado a partir dos dados disponíveis na literatura científica, nos relatórios técnicos apresentados à FEPAM e relacionados a empreendimentos localizados na Região Hidrográfica 75 e através da pesquisa na base de dados disponibilizada pelo programa Inter-Institutional Database of Fish Biodiversity in the Neotropics (NEODAT; http://www.neodat.org). O levantamento foi procedido nas bases disponíveis em 2003.

Após o levantamento de todos os nomes de espécies citadas para a região, foi realizado um levantamento dos nomes válidos, não válidos e sinonímias para a finalização de uma lista atualizada das espécies válidas com ocorrência registrada na área em análise (Reis et al., 2003).

5.5.2 Avaliação da vulnerabilidade das espécies

Vilella, Fábio S.

A vulnerabilidade das espécies foi avaliada de acordo com um conjunto de critérios previamente estabelecidos, quais sejam, endemismo, status de conservação, hábito de migração e sensibilidade.

As espécies endêmicas foram pontuadas de acordo com a sua distribuição na bacia do Uruguai. Espécies cuja distribuição conhecida restringe-se aos trechos Médio ou Alto Uruguai receberam 10 pontos. Espécies endêmicas da bacia do Uruguai mas que possuem ampla distribuição na bacia receberam 5 pontos.

Para o critério "status de conservação", utilizou-se o enquadramento das espécies de peixes que constam no Dec. Estadual 41.672/2002. As espécies de peixes da área de estudo enquadram-se em duas categorias: Criticamente em Perigo, para a qual foram atribuídos 10 pontos, e Vulnerável, que por sua vez recebe 5 pontos.

Quanto ao critério "hábito de migração", as espécies foram enquadradas em grandes e pequenas migradoras, de acordo com as distâncias percorridas por cada uma delas em sua migração reprodutiva. Essa classificação foi baseada em informações disponíveis na literatura sobre o comportamento reprodutivo das espécies (VAZZOLER, 1996; CEMIG/CETEC, 2000; NAKATANI et al., 2001; PAIVA et al., 2002) e através da discussão com especialistas.

Por fim, o critério "sensibilidade" foi criado para enquadrar espécies cuja sensibilidade elevada a alterações do hábitat é conhecida. Como no caso anterior, as espécies foram enquadradas nesse critério com base em informações disponíveis na literatura e através da discussão com especialistas.

A matriz de vulnerabilidade, gerada a partir desses quatro critérios, pode ser observada na Tabela 17. A escala de pontos adotada varia de 0 (espécie não enquadrada no critério ou para a qual não existe informação disponível) a 10 (espécie mais sensível de acordo com o critério analisado).

Ao final da análise uma espécie maximamente vulnerável obteria 40 pontos. Para a manutenção da escala, os valores finais foram divididos pelo número de critérios a fim de manter-se a amplitude de variação da escala, como demonstra a fórmula:

Vs = C1+C2+C3+C4= Y/4
onde:
Vs - pontuação atribuída à vulnerabilidade da espécie em análise
C - Pontos obtidos de acordo com o critério de análise
Y - Produto da soma de pontos

Tabela 17. Matriz de avaliação da vulnerabilidade das espécies de peixes da Bacia 75 e Alto Uruguai.


5.5.3 Mapeamento das espécies vulneráveis na bacia

Vilella, Fábio S.; Pedó, Ezequiel; Rücker, Alexandre

Para todas as espécies consideradas vulneráveis pela análise empregada, foi feito o levantamento de sua distribuição na área de interesse. Devido à diversidade de fontes de informação utilizadas e aos diversos objetivos que nortearam sua geração, os dados foram hierarquizados quanto à sua confiabilidade. De acordo com as diferentes fontes de informação consideradas no mapeamento das espécies, foram atribuídos pontos para diferenciar o grau de confiabilidade da informação, como demonstrado na Tabela 18.

Foram considerados como sendo alta confiabilidade (valor 4) os dados obtidos pela pesquisa na base de dados NEODAT II em que são apresentados os registros de animais tombados em coleções científicas de todo o mundo. Para a pesquisa na base de dados foram utilizadas como palavras chave:

Country = Brasil; State = Rio Grande do Sul; Drainage = Uruguay
Country = Brasil; State = Rio Grande do Sul; Drainage = Uruguay; County = Nome do município
Country = Brasil; State = Rio Grande do Sul; Drainage = Uruguay; Genus = Gênero & Species = Espécie

Os dados obtidos em literatura científica foram tratados da mesma forma que os dados da base NEODAT, e as principais fontes utilizadas foram BERTOLETTI et al. (1990), LUCENA & KULLANDER (1992), BUCKUP & REIS (1997), REIS & SCHAEFER (1998), REIS & PEREIRA (2000), BERTACO & MALABARBA (2001) CÂMARA & HAHN (2002) e PEREIRA & REIS (2002).

Foram considerados como menos confiáveis (valor 3) os dados apresentados em estudos de impacto de empreendimentos hidrelétricos e em relatórios de monitoramento ou diagnósticos apresentados pelos empreendedores. Essa classificação foi assim definida devido à falta de possibilidade de confirmação da informação, já que em sua maioria os consultores não tombam as amostras em coleções científicas.

Devido à escassez de informações sobre a distribuição da ictiofauna, foram também considerados os relatos ou informações orais apresentadas em relatórios técnicos ou ainda aquelas obtidas durante a visita a campo. Essas informações foram tratadas como complementares e receberam menor valor de confiança (valor 2). Pode ser acrescentado ainda que, via de regra, esses registros apontam a ocorrência de espécies de fácil identificação pela comunidade, normalmente relacionados à espécies de importância para a pesca.

Por fim, a partir dos dados pontuais de ocorrência, foram feitas extrapolações das distribuições das espécies. Essas extrapolações pretendem identificar as áreas potenciais de ocorrência de espécies registradas na bacia. Devido às particularidades conhecidas de cada espécie, os critérios de extrapolação foram adequados individualmente. Dessa forma, espécies endêmicas do médio ou alto rio Uruguai tiveram seus dados extrapolados apenas em sua zona de endemismo.

Espécies de ampla distribuição na bacia, como os grandes migradores, tiveram os dados extrapolados para toda a área de estudo, sendo o critério determinante para a definição de sua potencial ocorrência em um rio a menor ordem (sensu STHRALER, 1952) para a qual teve sua ocorrência positivamente registrada.

Tabela 18. Pontuação atribuída as diferentes fontes de informação que subsidiaram o mapeamento das espécies de peixes.


A partir do mapeamento da distribuição de cada espécie vulnerável e, de acordo com a fonte de informação utilizada no mapeamento, os trechos do rio passaram a ser pontuados.

Os pontos foram atribuídos aos trechos de acordo com a fórmula:
Vt = Vs x Fi
onde:
Vt - valor atribuído ao trecho de rio
Vs - vulnerabilidade atribuída à espécie
Fi - pontuação atribuída à fonte de informação

Após o processamento da relação entre a vulnerabilidade da espécie e da fonte de informação responsável por sua espacialização os valores finais foram escalonados em bytes.
5.5.4 Vulnerabilidade das zonas de endemismo do rio Uruguai

Vilella, Fábio S.; da Silva, José Francisco P.

Devido à falta de estudos sistematizados na região sob análise e ao elevado número de espécies endêmicas conhecidas para a bacia do Uruguai, foi adotada uma classificação do rio de acordo com o seu potencial para conter espécies endêmicas. Essa classificação foi gerada a partir do conhecimento sobre a ocorrência de espécies endêmicas em cada zona. Dessa forma, foram definidas duas zonas de endemismo, sendo a primeira a zona do Médio Uruguai, que compreende a área da Barragem do Salto, na República do Uruguai, até o salto de Yucumã, junto ao Parque Estadual do Turvo. A segunda é denominada zona do Alto Uruguai e estende-se do salto de Yucumã até as cabeceiras da bacia. Cada zona foi valorada de acordo com seu potencial de endemismo, como demonstra a Tabela 19.

Tabela 19. Pontuação atribuída às zonas de endemismo do rio Uruguai.



Porém, considerando que é nos tributários que os endemismos podem estar melhor representados, principalmente em conseqüência do isolamento geográfico dessas regiões causado por barreiras naturais (grandes quedas d'água, por exemplo), esses tributários também foram ordenados de acordo com seu potencial de endemismo. A ordenação dos trechos de rio seguiu o método proposto por STHRALER (1952) e os pontos atribuídos a cada classe podem ser observados na Tabela 20.

Tabela 20. Pontuação atribuída às ordens de rio da bacia do Uruguai.



Assim a vulnerabilidade das zonas de endemismo do rio Uruguai é calculada como o produto da relação entre a zona de endemismo e a ordem de rio, como apresentado na fórmula:

Vze = ZE x O
onde:
Vze - vulnerabilidade da zona de endemismo
ZE - pontuação da zona de endemismo
O - pontuação atribuída à ordem de rio
Após o processamento da relação apresentada na fórmula anterior os valores foram escalonados em bytes.

5.5.5 Distância entre barramentos

Vilella, Fábio S.

A distância entre barramentos de rios tem sido pouco discutida em avaliações de impacto de empreendimentos dessa natureza no Brasil. Em geral, distâncias mínimas entre empreendimentos têm sido arbitrados nos estudos sem subsídio teórico. Por exemplo, CEEE (2000) classifica intervalos entre barramentos maiores que 10 km como pouco impactantes enquanto BECKER & GUADAGNIN (2002) atribuíram 20 km como distância mínima entre barramentos na bacia do sistema Taquari-Antas no Rio Grande do Sul.

De acordo com AGOSTINHO et al. (2004), no trecho do rio Paraná existente entre o limite superior do reservatório da UHE Itaipu e a UHE Porto Primavera existem 250 Km de rio livre nos quais ocorrem condições para a reprodução dos grandes migradores. Condição essencial para a manutenção dessas populações nesse trecho é a existência de dois tributários livres de barramentos, nos quais existem rotas que atingem cerca de 220 km a montante do lago de Itaipu, onde foram confirmadas ocorrências de desovas de espécies migradoras. Por tratar-se da única informação disponível de um segmento de rio em que é viável a manutenção de todas as populações das espécies de peixes migradores e, considerando que desde o fechamento da barragem até o presente somam-se 21 anos, essa medida subsidia o critério adotado nesse estudo. A distância referencial de 80 km adotada aqui baseia-se também na informação do mesmo autor (AGOSTINHO et al., 2004) de que em trecho de 80 km do rio Paranapanema existente entre os Reservatórios dasd UHE Capivara e Salto Grande, mantêm-se populações de dourado (Salminus maxillosus) após 15 anos da construção dessas barragens.

A primeira decisão tomada na elaboração de cenários considerando os trechos de rio livre foi o estabelecimento de locais de origem das medidas de distância. Apesar do estudo estar limitado ao sul por um critério político, foi considerada a fisionomia do rio Uruguai na definição da origem das medidas de distância. Dessa forma o rio Uruguai pode ser classificado em três segmentos distintos, podendo ser denominados de segmento de campanha, segmento de transição e segmento de planalto. O segmento de campanha tem origem na cota máxima do reservatório da barragem do Salto na República Oriental do Uruguai e limite superior atribuído no rio Uruguai junto à foz do rio Icamaquã. Essa definição inclui o segmento sul da área delimitada para esse estudo, compreendendo a bacia do rio Butuí, pertencente à região fisionômica da Campanha. Por ser um segmento de menores declividades e menos propenso à existência de barreiras geográficas, é plausível acreditar que nesse segmento os peixes migradores demandem distâncias maiores de deslocamento para atingir o limiar fisiológico necessário para o amadurecimento de suas gônadas e para que seja efetuada a desova. Por isso na área de estudo o segmento de campanha foi considerado como não passível de barramento.

O segmento de transição foi delimitado pela foz do rio Icamaquã e o ponto do rio Uruguai na altura do município de Garruchos.

O segmento de planalto tem no rio Uruguai, no município de Garruchos o seu limite sul e estende-se até suas cabeceiras.

As medidas foram tomadas da origem até o limite de 3ª ordem de acordo com a classificação proposta por STHRALER (1952), pois, de acordo com os dados de distribuição dos grandes migradores existentes na bacia, esse seria o limite superior de migração para a maioria dessas espécies. Os segmentos de rio foram pontuados de acordo com os critérios estabelecidos na Tabela 21.

Os trechos foram medidos desde a origem de cada segmento até o limite superior de cada tributário de 3ª ordem. Em situações em que os segmentos medidos apresentavam-se fragmentados devido a existência de uma barreira (barragem hidrelétrica), o trecho compreendido entre a origem e a barragem foi valorado de acordo com sua dimensão (Tabela 21). Nessas situações, a contagem do trecho foi reiniciada considerando-se o limite à montante do lago da barragem como um novo ponto de origem (0). Quando não foram encontradas barreiras e o trecho medido alcançou 250 Km, foi estabelecido um trecho de tolerância de 20 Km para que fosse restabelecida nova contagem. Dessa forma, a calha principal dos rios é considerada de fundamental importância para a manutenção de rotas migratórias que permitam a manutenção de populações de peixes de piracema.

Tabela 21. Pontuação atribuída a rotas de migração de peixes considerando sua extensão e a conectividade ao rio Uruguai.



Foram simulados quatro cenários principais, o primeiro representando a situação atual da área de estudo e o segundo considerando a implantação de todos os barramentos para aproveitamento hidrelétricos inventariados por CEEE (2000) e CERILUZ (2000). Esses dois cenários foram avaliados considerando-se a implantação da UHE Garabi no rio Uruguai.

5.6 CRITÉRIOS RELATIVOS AO MEIO FÍSICO

Tendo em vista a carência de dados relativos ao meio físico para a área de estudo, a partir do universo de informações disponíveis foram selecionadas variáveis espacializáveis e compatíveis com a escala adotada neste estudo. Sendo assim, as bases de dados utilizadas foram o RADAM-BRASIL, o inventário da CEEE e CERILUZ e mapeamentos de solos da EMATER-UFRGS.

5.6.1 Solos

Machado, Nelson A. F. e Cruz, Rafael C.

A estrutura do solo depende do tratamento que recebe, e a produtividade das culturas agrícolas e longevidade da sua bioestrutura refletem a sua adequação às atividades de usos.

A modificação do solo pelo homem estabelece sua degradação através da intervenção inadequada.

São diversos os processos químicos e físicos causadores da degradação do solo. A erosão está diretamente relacionada a problemas de assoreamento de corpos hídricos, manifestada em taxas elevadas de material em suspensão, na redução da profundidade da camada eufótica e na modificação da qualidade da água, afetando a produtividade primária e toda a rede trófica do sistema.

Os solos apresentam elevada correlação com as unidades geológicas, com o relevo, com os processos de intemperismo e com as condições climáticas.

A sensibilidade do solo aos diferentes tipos de degradação depende das suas características. Assim, foi utilizado o mapa de solos do Rio Grande do Sul na escala 1:750.000 (STRECK et al., 2002) para caracterizar a susceptibilidade à erosão.

O grau de resistência dos solos aos impactos ambientais, estabelecida em FEPAM (2001) foi utilizado como indicador de fragilidade ambiental (Tabela 22). Este critério estabeleceu uma hierarquia entre os tipos de solos e a sua fragilidade.

Tabela 22. Valoração dos tipos de solos existentes na área de estudo de acordo com a sua fragilidade.


5.6.2 Geomorfologia

Machado, Nelson A. F.

Com base na descrição do RADAM-BRASIL estabeleceu-se uma análise, a partir da ocorrência das unidades geomorfológicas e das suas caracterizações. Esta análise constituiu-se basicamente em confrontar as características da unidade geomorfológica com os possíveis efeitos da implantação de barramentos, considerando-se a alteração dos processos erosão - transporte - deposição.

Tendo como princípio que toda a intervenção por barramento de curso de água, independente da escala, ocasiona uma elevação do nível de base, considerado o trecho fluvial a montante do barramento, estes processos estabelecem um envelhecimento dos cursos fluviais. Com base neste paradigma, as unidades geomorfológicas estabelecidas pelo RADAM-BRASIL foram analisadas e pontuadas (Tabela 23), considerando-se o formato dos vales, as declividades e as formas de relevo.


Tabela 23. Valoração das unidades geomorfológicas existentes na área de estudo.



5.6.3 Áreas Mineiras

Machado, Nelson A. F.

O subsolo brasileiro é propriedade da sociedade e, como tal, qualquer empreendimento mineiro de exploração de subsolo deve pleitear as licenças pertinentes nas três esferas: municipal, estadual e federal.

Os regimes de aproveitamento das substâncias minerais, atendendo ao Código de Mineração Brasileiro, levam os empreendedores mineiros à duas situações distintas: o licenciamento mineral e a pesquisa mineral.

O licenciamento mineral deve ser pleiteado por aqueles empreendimentos mineiros que irão explorar o bem mineral, o qual não deverá sofrer qualquer tipo de beneficiamento, constituindo-se em bem mineral abundante na crosta terrestre. Tem como limite 50 ha por área máxima solicitada.

Do Código Nacional de Mineração destaca-se:

Os bens minerais poderão ser aproveitados pelo regime de licenciamento, ou de autorização e concessão, na forma da lei:

I - areias, cascalhos e saibros para utilização imediata na construção civil, no preparo de agregados e argamassas, desde que não sejam submetidos a processo industrial de beneficiamento, nem se destinem como matéria-prima à indústria de transformação;
II - rochas e outras substâncias minerais, quando aparelhadas para paralelepípedos, guias, sarjetas, moirões e afins;
III - argilas usadas no fabrico de cerâmica vermelha;
IV - rochas, quando britadas para uso imediato na construção civil e os calcários empregados como corretivo de solo na agricultura.

Segundo o código de mineração brasileiro, a pesquisa mineral é a execução dos trabalhos necessários à definição da jazida, sua avaliação e a determinação da viabilidade do seu aproveitamento econômico. A pesquisa mineral compreende, entre outros, os seguintes trabalhos de campo e de laboratório: levantamentos geológicos pormenorizados da área a pesquisar, em escala conveniente, estudos dos afloramentos e suas correlações, levantamentos geofísicos e geoquímicos; abertura de escavações visitáveis e execução de sondagens no corpo mineral; amostragens sistemáticas; análises físicas e químicas das amostras e dos testemunhos de sondagens; e ensaios de beneficiamento dos minérios ou das substâncias minerais úteis, para obtenção de concentrados de acordo com as especificações do mercado ou aproveitamento industrial.

Na área do estudo foi executado levantamento junto ao Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM) para mapear as áreas licenciadas, seja na modalidade de licença mineral, seja na de pesquisa mineral.

Os dados levantados foram as poligonais que limitam as concessões, referenciadas a marcos topográficos existentes e nas cartas topográficas do exército na escala 1:50.000.

As áreas concedidas para a pesquisa mineral foram consideradas como mais importantes do que as áreas concedidas para o licenciamento mineral.

A modalidade de pesquisa mineral determina o aprofundamento de estudos tais como gênese, concentração, cubagem e vida útil da jazida. Envolve, também, a exigência de uma maior competência financeira do empreendedor, a ser demonstrada através de documentação pertinente, tendo em seu escopo a geração do conhecimento da ocorrência mineral que ao fim do estudo poderá ser transformada em jazida mineral ou não. Portanto, apresenta risco econômico ao empreendedor. Além disso, as substâncias que são pesquisadas para serem transformadas, geralmente, representam minerais raros e de importância para o país.

Por outro lado, as áreas concedidas para licenciamento mineral possuem jazidas de minerais abundantes e comuns, como areia, brita e cascalho, por exemplo, que representam insumos importantes para a sociedade. Neste modelo de licenciamento, o bem mineral pode ser explorado a partir da emissão da licença. A Tabela 24 apresenta os valores atribuídos para as áreas de concessão mineral.

Tabela 24. Valoração das áreas de concessão mineral.



5.6.4 Qualidade da Água

Schwarzbold, Albano e Cruz, Rafael C.

A qualidade da água é um dos fatores mais restritivos para a implantação de barragens. De acordo com COOTE & GREGORICH (2000), a qualidade da água deve ser avaliada de forma holística, considerando os aspectos apresentados na Figura 6.

Face à carência de dados de monitoramento sistemático, situação da maior parte do território, a avaliação da qualidade da água deve buscar indicadores possíveis de serem obtidos para toda a área em estudo. Estes indicadores devem, também, possibilitar uma avaliação de cargas poluidoras urbanas e rurais e devem ser obtidos a partir de dados espacializáveis, ao menos, na escala da malha municipal.

As cargas poluidoras orgânicas geradas pela população foram avaliadas tomando-se por base os dados de domicílios por situação de saneamento de esgotos e de número de habitantes por domicílios urbanos e rurais, disponibilizados pelo IBGE (http://www.ibge.gov.br) e pela FEE (2001).


Figura 6. Abordagem holística para avaliar qualidade da água.
Fonte: COOTE & GREGORICH, 2000.

As cargas remanescentes foram estimadas com base no equivalente populacional da DBO5 (54 g/hab/dia) e nos fatores de redução, de acordo com a classificação das situações dos domicílios conforme a classe de tratamento. Consideraram-se somente as categorias que implicam em transposição de cargas para os cursos de água diretamente. Situações inadequadas de saneamento que geram contaminação do solo ou das águas subterrâneas foram desconsiderados, uma vez que esta carga possui um tempo de retardo para afetar a qualidade dos rios, o qual apresenta-se em escala incompatível com o tempo de decisão deste estudo. Consideraram-se, para fins deste indicador, as populações ligadas à rede geral, com fossa séptica e com fossa séptica ligada ao esgoto pluvial. Os fatores de redução foram adotados de CNEC (1980) e estão expressos na Tabela 25.

Tabela 25. Fatores de redução de cargas de DBO (CNEC, 1980).



Assim a carga remanescente para cada município é resultante da soma das cargas remanescentes para cada situação de saneamento, onde carga remanescente é igual ao produto da população pela carga unitária (54 g/hab/dia) e pela recíproca do respectivo fator de redução (0,5 ou 0,15). Esta carga foi relativizada para a área do município e expressa a carga potencial de DBO que é gerada por quilômetro quadrado. Como quanto maior a carga é maior a fragilidade, o índice foi reescalonado para escala de bytes através de uma transformação inversamente proporcional no módulo Fuzzy do Idrisi32, de modo a passar a expressar a favorabilidade para implantação de barramentos.

Outra fonte de cargas orgânicas que pode ser espacializada refere-se aos rebanhos. Os efetivos foram obtidos do IBGE (http://www.ibge.gov.br) e da FEE (2001). A carga neste caso é bruta, pois não se pode avaliar, com os dados disponíveis, o tipo de tratamento utilizado ou ausência de tratamento. As cargas brutas em DBO foram estimadas a partir das cargas de fósforo total para bovinos, eqüinos, suínos, caprinos e aves listadas em LASSEVILS & BERRUX (2000), utilizando-se o equivalente de 1 g P = 21,6 g DBO (OSPAR, 2000). A Tabela 26 apresenta os dados utilizados.

Tabela 26. Cargas unitárias de fósforo e DBO, por cabeça.

(adaptado de LASSEVILS & BERRUX, 2000).

A carga bruta de DBO foi, então, estimada multiplicando-se o efetivo pela carga unitária de DBO. Para compor a carga total, foi utilizado o critério de que as criações predominantemente confinadas (aves e suínos) impactam cinco vezes mais que as não confinadas. Este fator foi adotado a partir da relação existente entre lavouras temporárias e permanentes, justificadas na sequência, dada a ausência de informações. Deste modo, o índice derivado das cargas foi obtido através da seguinte fórmula:

Irebanho = (0,2 * dbo bov) + (0,2 * dbo equ) + (0,2 * dbo ovi) + (dbo sui) + (dbo ave)

Este índice foi, então, relativizado, dividindo-se pela área municipal em quilômetros quadrados, passando a expressar a carga potencial de DBO que é gerada pelos rebanhos por quilômetro quadrado. Como quanto maior a carga é maior a fragilidade, o índice foi reescalonado para escala de bytes através de uma transformação inversamente proporcional no módulo FUZZY do IDRISI32, de modo a a expressar a favorabilidade para implantação de barramentos.

As cargas de nutrientes oriundas da atividade agrícola foram indicadas por um índice derivado das áreas colhidas ou destinadas a colheita disponibilizadas pelo IBGE (http://www.ibge.gov.br) e pela FEE (2001). Os dados foram agregados em culturas temporárias e permanentes. O índice foi gerado da seguinte forma:

" Somaram-se as áreas ocupadas por todas as culturas temporárias, por município.
" Somaram-se as áreas ocupadas por todas as culturas permanentes.
" Obteve-se um índice somando-se a área de culturas temporárias com a quinta parte da área das culturas permanentes (vide explicação abaixo).
" Relativizou-se o índice dividindo-se pela área do município, em hectares.

Considerou-se que as perdas de solo em lavouras permanentes é menor que a de lavouras temporárias na ordem da quinta parte com base em dados presentes em SANTA CATARINA (1994), para latossolos, que expressam perdas de solo da ordem de 810 kg/ha para ensaios de chuva em solos sem movimentação e de 4.300 kg/ha para solos preparados com duas passagens de grade. Considera-se, para fins de modelagem, que a perda de nutrientes é proporcional à perda de solos.

O índice expressa, portanto, a probabilidade de aporte de nutrientes oriundos das lavouras por unidade de área. Quanto maior o índice, maior o aporte potencial. Como quanto maior a carga é maior a fragilidade, o índice foi reescalonado para escala de bytes através de uma transformação inversamente proporcional no módulo FUZZY do IDRISI32, de modo a expressar a favorabilidade para implantação de barramentos.

As cargas de poluentes industriais foram avaliadas conforme FEPAM (1997), sendo consideradas as cargas remanescentes de DBO5,20 e de cargas metálicas agregadas. As cargas de cada município foram divididas pela área em quilômetros quadrados dos respectivos municípios, fornecendo os índices de cargas orgânicas industriais remanescentes e cargas metálicas remanescentes por quilômetro quadrado. Estes índices relativos foram reescalonados para escala de bytes através de uma transformação inversamente proporcional, a fim de expressar a favorabilidade para implantação de barramentos.

5.7 EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
Cruz, Rafael C.

A eficiência energética de cada empreendimento proposto foi avaliada a partir do índice potência/área. Considera-se que quanto maior a potência obtida por unidade de área alagada, mais eficiente será o empreendimento. Observa-se que esta relação está associada à forma do vale e à declividade do eixo longitudinal do rio. Barragens situadas em vales bastante encaixados e com boas quedas naturais otimizam esta situação.

As informações foram obtidas a partir de dados dos próprios inventários ou estimadas através da interpolação das curvas de nível em escala 1:50.000 obtidas das cartas da DSG, considerando-se a cota no nível da água máximo (Namax).

O índice potência/área para a iésima barragem foi obtido dividindo-se a potência firme (MW médios) pela área do reservatório em hectares:

(índice potência/área)i = (potência)i/(área do lago no Namax)i

O índice de eficiência energética foi calculado padronizando-se o índice potência/área para escala de 0-100:

(Índice de eficiência energética)i = ((índice potência/área)i x 100) / máximo(índice potência/área)

5.8 ÍNDICE DE FAVORABILIDADE AMBIENTAL DA DRENAGEM

Cruz, Rafael C.

O índice de favorabilidade ambiental da drenagem foi obtido extraindo-se os valores do índice ambiental para todas as células que compõem a drenagem da área em estudo, expressos como valor médio decorrente do cruzamento dos mapas componentes de cada bloco temático. Este procedimento foi elaborado utilizando-se do módulo EXTRACT do IDIRISI32, empregando-se o mapa da drenagem (valor 1 para a drenagem e zero para o que não é drenagem) como mapa identificador das feições e os mapas resultantes da análise multi-critério como mapa de valores. Utilizou-se o valor médio para caracterizar a qualidade ambiental da drenagem de toda a bacia. Este procedimento foi desenhado para capturar o impacto da inserção de uma ou várias barragens na qualidade de toda a bacia hidrográfica, em função da propagação da perda de qualidade ambiental resultante da fragmentação dos rios, operacionalizando o critério proposto pela Comissão Mundial de Represas (CMR, 2000). Neste estudo, esta análise foi restrita aos quatro cenários definidos pela ausência de novos barramentos, somente a construção da UHE Garabi, a construção de todas as barragens dos inventários (CEEE e CERILUZ) e de todas mais a UHE Garabi.

No entanto, este índice permite a construção de uma curva cumulativa de perda de qualidade ambiental para uma bacia hidrográfica para qualquer ordem de implantação de empreendimentos sugerida, permitindo a avaliação comparativa de diversos critérios de hierarquização de represas efetuada com base em critérios energéticos ou ambientais constituídos com base nos impactos locais.

5.9 ÍNDICE DE FAVORABILIDADE AMBIENTAL RELATIVA DAS BARRAGENS

Cruz, Rafael C.

O índice de favorabilidade ambiental relativa das barragens foi obtido através da extração dos valores médios do índice ambiental expresso na análise multi-critério para as áreas de inundação das barragens propostas, excluídas as áreas originalmente pertencentes à drenagem. Para excluir as áreas da drenagem do mapa resultante da análise multi-critério, multiplicou-se o mesmo pelo mapa da drenagem, sendo atribuído valor zero para as áreas pertencentes à drenagem e um para as demais áreas. Para extração dos valores médios para cada barragem, utilizou-se o módulo EXTRACT do IDRISI32, considerando-se o mapa de polígonos contendo as áreas de inundação como mapa de feições e o mapa resultante da multiplicação acima descrita como mapa de valores.

O índice extraído através deste procedimento expressa o valor médio para cada barragem, porém refere-se a um procedimento "célula-a-célula", não refletindo o tamanho das barragens. Para resolver esta deficiência, foi atribuído um redutor deste índice de favorabilidade ambiental proporcional ao tamanho do reservatório da barragem.

Para compor este redutor foi calculada a área relativa de cada barragem através do seguinte equacionamento:

Área inundada relativa = (Área inundada no Namáx. x 100)/ máximo (Área inundada no Namáx.)

O resultado final do índice foi calculado da seguinte forma:

Índice de Favorabilidade Ambiental Relativa = (índice de favorabilidade ambiental x 0,5) - (área inundada relativa x 0,5)

Assim, quanto maior a área inundada, maior o redutor da favorabilidade. Neste caso, os pesos atribuídos para o redutor são iguais. Outros valores podem ser atribuídos.