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      8. DEFINIÇÃO DA VIABILIDADE DE LICENCIAMENTO DOS APROVEITAMENTOS HIDRELÉTRICOS INVENTARIADOS NAS BACIAS ESTUDADAS
       


Binotto, Raquel B.; Rodrigues, Ana Lúcia M.; Dotto, João Carlos P.; Wolff, Luis Fernando B.

A definição da viabilidade de licenciamento ambiental de empreendimentos de geração hidrelétrica na Sub-bacia 75 (ANEEL) foi realizada com a finalidade de orientar o processo licenciatório na FEPAM, planejando a implantação e o desenvolvimento dessa atividade regionalmente.

Este é um novo enfoque no processo de licenciamento, considerando que tradicionalmente, é somente após a etapa de Inventário Hidrelétrico, na fase de Estudo de Viabilidade, que o empreendedor solicita as licenças ambientais junto ao órgão ambiental, de forma puntual, por aproveitamento hidrelétrico (AHE).

Neste contexto, a partir da metodologia empregada e dos resultados obtidos, explicitados nos capítulos anteriores, a equipe técnica da FEPAM/RS desenvolveu um diagrama com critérios hierarquizados para seleção prévia dos aproveitamentos hidrelétricos passíveis de licenciamento ambiental no âmbito das bacias dos rios Ijuí e Butuí-Piratinim-Icamaquã.

Tais aproveitamentos hidrelétricos foram definidos previamente nos inventários hidrelétricos realizados pela CEEE (2000) e CERILUZ (2000), contemplando 41 (quarenta e um) AHE´s (Figura 2). Destes, 04 (quatro) AHE´s são comuns a ambos os inventários, o que reduziu a análise a 37 (trinta e sete), dos quais 03 (três) já estão em processo de implantação e/ou já foram implantados.

Assim, a análise final contemplou 34 (trinta e quatro) AHE´s, tendo sido realizada desde uma escala regional, a Região Hidrográfica do rio Uruguai, até um nível de impacto local, conforme descrito no prosseguimento e sintetizado no diagrama de tomada de decisão apresentado na Figura 27.

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Figura 27. Diagrama de tomada de decisão.

8.1 NÍVEL REGIONAL

Inicialmente, utilizou-se a classificação da rede hidrográfica conforme condicionantes fisiográficos (Tabela 3) quais sejam:
rios de campanha: rio Butuí e seus afluentes;
rios de transição entre a campanha e o planalto: rio Icamaquã e seus afluentes; e
rios de planalto: rios Piratinim e Ijuí, e seus respectivos afluentes.

Adotou-se, então, para os rios classificados anteriormente, um dos critérios da Comissão Mundial de Represas (CMR, 2000) para avaliação de impacto de barragens em rede, qual seja, a necessidade de manter pelo menos um rio livre de barramentos por tipologia considerada.

Por este critério, das bacias estudadas, foram inviabilizados os seguintes aproveitamentos hidrelétricos (Tabela 32):

Tabela 32. Aproveitamentos Hidrelétricos (AHE´s) inviabilizados pelo critério de manter pelo menos um rio livre de barramentos por tipologia de rio.


Na tipologia de rios de Planalto, na qual existia mais de um rio para ser escolhido, selecionou-se o rio Piratinim, tendo em vista que no rio Ijuí já estão implantados diversos aproveitamentos hidrelétricos, e também porque este é o rio que apresenta a maior potencialidade energética de toda a Sub-bacia 75.

8.2 NÍVEL DE IMPACTO LOCAL

O segundo critério adotado, também estabelecido pela CMR, foi o de manter um trecho de rio livre entre barragens. Assim, cada aproveitamento foi avaliado considerando sua influência na fragmentação de ecossistemas aquáticos e na propagação dos seus impactos em rede, avaliando-se o grau de significância destes efeitos conforme sua incidência em trechos de 250 km, entre 80 e 250 km, e menores que 80 km. O tamanho do trecho foi definido com base em dados obtidos de sustentabilidade da população de peixes migradores (Capítulo 7.5.5). Além do tamanho do trecho, foi considerada também a sua conectividade ou não ao rio Uruguai.

Como a definição de trechos varia conforme o cenário considerado, foi selecionado o mapa de trechos do Cenário 2 para avaliar cada um dos 25 (vinte e cinco) AHE´s restantes. Tal cenário considera a hipótese de implantação da UHE Garabi, hidrelétrica de grande porte com previsão de instalação no trecho inferior do rio Uruguai, situada a montante da foz (no rio Uruguai) dos rios principais das bacias estudadas.

A situação de cada AHE nos trechos é apresentada a seguir, na Tabela 33.

Tabela 33. Localização dos Aproveitamentos Hidrelétricos (AHE´s) nos trechos de rio, considerando sua conectividade ou não ao rio Uruguai, com base no cenário dois.


Na seqüência, foi avaliado o impacto local da implantação dos aproveitamentos hidrelétricos (AHE´s) considerando a extensão do trecho de rio afetado e sua conexão ao rio Uruguai, para cada aproveitamento, identificando-se os seus respectivos índices IAR e IEE conforme segue:

Índice de Favorabilidade Ambiental Relativa (IAR): este índice equivale à média ponderada de todos os fatores ambientais considerados nos mapas síntese, extraindo o valor atribuído à calha dos cursos d'água inseridos no futuro reservatório, tomando-se como referência o valor adotado para o modelo escolhido pelo grupo de trabalho da FEPAM como o mais representativo da realidade da bacia (modelo 8, cenário 2). Em síntese, o IAR expressa a favorabilidade para implantação dos empreendimentos, avaliando o efeito destes sobre a área a ser alagada, excluindo a drenagem. Para este índice foram atribuídos conceitos de avaliação, variando de muito favorável a pouco favorável, conforme os patamares identificados na Figura 24, para as seguintes faixas do IAR:

Até 60 - Pouco favorável
60 a 80 - Medianamente favorável
80 a 95 - Favorável
Acima de 95 - Muito Favorável

Índice de Eficiência Energética (IEE): este índice corresponde à relação entre a energia firme a ser gerada e a área a ser inundada para cada aproveitamento, comparada ao máximo valor encontrado para esta relação dentre todos os aproveitamentos inventariados, escalonados de 0 a 100. Da mesma forma que para o IAR, para o IEE também foram atribuídos conceitos de avaliação, variando de muito bom a ruim, conforme os patamares identificados na Figura 25, para as seguintes faixas:

Até 4 - Ruim
4 a 10 - Regular
10 a 20 - Bom
Acima de 20 - Muito bom

Desta forma, considerou-se que para aqueles empreendimentos incidentes sobre os trechos de 250 km, considerados menos favoráveis à implantação de barramentos, foram utilizados critérios diferenciados dos demais. Assim, aqueles AHE´s que fragmentam trechos de 250 km, foram avaliados segundo:

a) índices IAR e IEE;
b) situação do AHE no trecho, considerando sua posição nas extremidades ou no centro;
c) percentual de energia a ser gerada em relação à potência total inventariada na bacia em questão.
Para aqueles AHE´s incidentes sobre trechos entre 80 e 250 km, foram adotados os critérios (a) e (c) acima, acrescido da análise de sua posição em relação aos demais AHE´s do rio a ser barrado.

Para os demais AHE´s que afetam trechos menores que 80 km, foram utilizados somente os índices IAR e IEE, admitindo-se, desta forma, a fragmentação do rio em trechos menores que não garantem sustentabilidade de populações de peixes migradores.

Com base em todos os critérios acima elencados, foram inviabilizados onze AHE´s, conforme abaixo demonstrado, por sub-bacia avaliada.

8.2.1 Bacia Hidrográfica do rio Icamaquã

Conforme demonstrado na Tabela 34, os dois aproveitamentos do rio Itacurubi, únicos desta bacia que não foram excluídos pelo critério de rio livre de barramento por tipologia (Tabela 32), afetariam um trecho de 250 km conectado ao rio Uruguai. Apesar de apresentarem IAR´s favoráveis, sua eficiência energética, dentre todos os aproveitamentos previstos, é das piores, com previsão de alagamento de grandes áreas para uma geração de energia pouco expressiva, tendo sido considerados inviáveis de serem licenciados. Com a decisão, toda a bacia do rio Icamaquã ficou livre de barramento, inviabilizando 7,68% do total de energia inventariado na Sub-bacia 75.

Tabela 34. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos na bacia do rio Icamaquã.


8.2.2 Bacia Hidrográfica do rio Piratinim

Conforme demonstrado na Tabela 35, os aproveitamentos do rio Inhacapetum, únicos da bacia que não foram excluídos pelo critério de rio livre de barramento por tipologia (Tabela 32), afetariam um trecho de 250 km conectado ao rio Uruguai. Apesar de apresentarem IAR´s favoráveis, sua eficiência energética é ruim, com previsão de alagamento de grandes áreas para uma geração de energia pouco expressiva. Com a decisão, toda a bacia do rio Piratinim ficou livre de barramento, inviabilizando 17,15% do total de energia inventariado na Sub-bacia 75.

Tabela 35. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos na bacia do rio Piratinim.


8.2.3 Bacia Hidrográfica do rio Ijuí

Dos aproveitamentos do rio Ijuí (Tabela 36), o IJ-3g foi excluído pois, além de afetar trecho de 250 km, estando situado na porção central do trecho, apresenta baixo desempenho dos índices avaliados, com grande área a ser alagada, não compatível com a geração prevista de energia, apesar de, em comparação com os demais aproveitamentos das bacias estudadas, estar bem classificado em relação à potência a ser gerada.

Os aproveitamentos IJ-1e e IJ-2´ apresentam uma situação peculiar, uma vez que representam, em termos de potencial de geração de energia, aproximadamente 33% do total da sub-bacia 75, 43% da bacia do rio Ijuí e 60% do total previsto para o rio Ijuí. Ambos afetam trechos de 250 km, com IAR´s pouco favoráveis e IEE´s bom e regular, respectivamente. As áreas a serem alagadas, apesar de extensas, permitirão a geração de significativa energia para a região (aproximadamente 70 MW). Apesar dos fatores ambientais indicarem uma baixa viabilidade de implantação destes aproveitamentos, optou-se por avaliar a viabilidade destes empreendimentos através do licenciamento ambiental, pela apresentação de Estudo de Impacto Ambiental - EIA/RIMA, com a análise integrada de ambos, cotejando as hipóteses de implantação de ambos ou de somente um, desde que os arranjos sejam otimizados de tal forma que as áreas alagadas sejam reduzidas, sendo que o aproveitamento IJ-2´ somente será analisado nesta condição. Os estudos deverão ter ênfase nos aspectos de qualidade da água, mata ciliar e transposição de fauna íctica, além de contemplar medidas compensatórias proporcionais ao impacto causado, especialmente no que se refere à perda de ecossistemas terrestres.

Para o aproveitamento Fonte Ijuí, considerando que os dois índices avaliados são bons, a sua viabilidade será avaliada através de licenciamento comum (encaminhamento normal através do preenchimento de formulário específico - Informações para licenciamento de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), constante do site da FEPAM
www.fepam.rs.gov.br)

A Tabela 37 sintetiza, em termos de energia firme, os percentuais viabilizados ou não no rio Ijuí, a partir da análise efetuada.

Tabela 36. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Ijuí, bacia do rio Ijuí.


Tabela 37. Percentuais de energia firme viabilizados ou não - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Ijuí, bacia do rio Ijuí.


Dos aproveitamentos do rio Ijuizinho (Tabela 38), foi excluído o aproveitamento hidrelétirico identificado como IZ-3b, que apresentou um IAR medianamente favorável e um IEE ruim, com previsão de alague de uma grande área e pequena geração de energia.

Para os aproveitamentos IZ-1 e IZ-2, considerando que os dois índices avaliados são muito bons, com pequenas áreas a serem alagadas, compatíveis com a geração prevista de energia, a sua viabilidade será avaliada através de licenciamento comum.

Os demais, IZ-4 e IZ-5a, apesar de apresentarem IAR´s muito favoráveis, possuem IEE´s regulares, alagando áreas significativas em comparação com a potência a ser gerada. Para avaliação de sua viabilidade, devido a sua proximidade, deverão ser estudados em conjunto através de licenciamento - Relatório Ambiental Simplificado (RAS), com ênfase no endemismo de peixes e mecanismos de transposição de fauna íctica.

A Tabela 39 sintetiza, em termos de energia firme, os percentuais viabilizados ou não no rio Ijuizinho, a partir da análise efetuada.

Tabela 38. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Ijuizinho, bacia do rio Ijuí.


Tabela 39. Percentuais de energia firme viabilizados ou não - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Ijuizinho, bacia do rio Ijuí.


Dos aproveitamentos do rio Conceição (Tabela 40), apesar de todos apresentarem IAR´s muito favoráveis, foram excluídos os aproveitamentos CC-1a e CC-3 tendo em vista seus IEE´s ruins, com previsão de alague de grandes áreas para pequenas potências a serem geradas. Os demais podem ser avaliados através de licenciamento comum.

Tabela 40. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Conceição, bacia do rio Ijuí.


Na Tabela 41 são apresentados, em termos de energia firme, os percentuais viabilizados ou não no rio Conceição, a partir da análise efetuada.

Tabela 41. Percentuais de energia firme viabilizados ou não - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Conceição, bacia do rio Ijuí.


Dos aproveitamentos do rio Potiribú (Tabela 42), o PT-2 foi excluído devido ao seu IAR medianamente favorável e IEE ruim, com grande área a ser alagada e baixa potência de geração de energia.

O PT-1 será avaliado através de licenciamento comum.

A Tabela 43 sintetiza, em termos de energia firme, os percentuais viabilizados ou não no rio Potiribú, a partir da análise efetuada.

Tabela 42. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Potiribú, bacia do rio Ijuí.


Tabela 43. Percentuais de energia firme viabilizados ou não - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Potiribú, bacia do rio Ijuí.


O único aproveitamento previsto para o rio Caxambú (Tabela 44), CX-1, apesar de apresentar IAR muito bom, foi excluído devido ao seu IEE ruim, com baixa potência de geração de energia, não compatível com a grande área a ser alagada. Com a decisão, foi inviabilizado 0,80% do total de energia inventariado na Sub-bacia 75.

Tabela 44. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Caxambú, bacia do rio Ijuí.


Os aproveitamentos previstos no rio Fiúza (Tabela 45), FZ-1b e FZ-2´, foram considerados adequados para todos os critérios analisados, devendo ser avaliados através de licenciamento comum, viabilizando 66,67% da energia firme prevista para o rio Fiúza, 0,80% da energia firme prevista para a bacia do rio Ijuí e 0,60% do total inventariado.

Tabela 45. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Fiúza, bacia do rio Ijuí.


Dos aproveitamentos do rio Palmeira (Tabela 46), apesar de ambos apresentarem IAR´s muito favoráveis, somente o PL-2a foi excluído devido ao seu IEE ruim, com grande área a ser alagada e baixa potência de geração de energia. O PL-1 será avaliado através de licenciamento comum.

A Tabela 47 sintetiza, em termos de energia firme, os percentuais viabilizados ou não no rio Palmeira, a partir da análise efetuada.

Tabela 46. Principais aspectos avaliados no nível de impacto local - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Palmeira, bacia do rio Ijuí.


Tabela 47. Percentuais de energia firme viabilizados ou não - Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) previstos no rio Palmeira, bacia do rio Ijuí.


Considerando a explanação acima, a Tabela 48 sintetiza, por bacia e rio barrado, o número de AHE´s inviabilizados e os passíveis de licenciamento, constatando-se que a avaliação efetuada resultou em vinte (20) AHE´s inviabilizados para o licenciamento ambiental e catorze (14) viáveis.

Tabela 48. Relação dos Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) avaliados passíveis ou não de licenciamento ambiental.


Em termos de área alagada, conforme ilustra a Tabela 49, do total previsto, se todos os empreendimentos fossem viabilizados, 78% da área total prevista para alague foi excluída. Em contrapartida, do total de energia firme a ser gerada, com 100% de aproveitamentos implantados, foram mantidos 59% de geração.

Tabela 49. Relação entre área alagada e energia gerada para os Aproveitamentos Hidroelétricos (AHE´s) avaliados.


Neste contexto, fica a constatação de que os procedimentos metodológicos adotados e acima descritos permitem que seja efetuada uma análise integrada do ambiente, ao nível de bacia hidrográfica, previamente ao licenciamento ambiental puntual, otimizando os procedimentos de licenciamento, e apontando para a sua replicabilidade em outras situações.