anterior índice próxima  
encerrar        
        2. INTRODUÇÃO
       

Cruz, Rafael C.

Atualmente há uma grande mobilização internacional para que se faça uma análise crítica dos projetos de barramentos de cursos de água ao redor do planeta. Em especial, destaca-se o relatório final da Comissão Mundial de Represas, que propõe um conjunto de princípios para a análise de projetos partindo de uma perspectiva de desenvolvimento sustentável (CMR, 2000).

Dentro desse contexto, este trabalho apresenta uma classificação dos impactos ambientais dos barramentos potenciais localizados na bacia 75, que englobam os rios Ijuí, Piratinim, Icamaquã e Butuí, no noroeste do Rio Grande do Sul, como segue:

Impactos de primeira ordem: são aqueles resultantes das modificações nas condições físicas, químicas e geomorfológicas conseqüentes do barramento.
Impactos de segunda ordem: são as modificações da produtividade primária em decorrência dos impactos de primeira ordem.
Impactos de terceira ordem: são aqueles que atingem a fauna, relacionados aos eventos resultantes dos impactos de primeira e segunda ordem.

Poderiam ser acrescentados ainda impactos de quarta ordem, que seriam os resultantes das demais ordens sobre a atividade produtiva e qualidade de vida do ser humano. Normalmente, os estudos dessa natureza não incluem os impactos sócio-econômicos na dimensão dos ecossistemas. No entanto, existe uma tendência de inclusão sistêmica do meio sócio-econômico no conceito de ecossistema total do ser humano, tanto na tradição da geografia como da ecologia de paisagem.

A Comissão Mundial de Represas considera como mais importantes os seguintes tipos de impactos sobre os ecossistemas:

impactos sobre os ecossistemas terrestres e sua biodiversidade;
emissão de gases causadores do efeito estufa;
impactos das vazões alteradas para os ecossistemas aquáticos de jusante e sua biodiversidade;
impactos da modificação do regime de pulsos hidrológicos sobre as planícies de inundação;
impactos sobre a pesca;
diversificação de ecossistemas aquáticos;
impacto cumulativo de represas em um mesmo sistema fluvial.

Cada tipo inclui impactos de determinadas ordens. De modo geral, o documento apresenta uma avaliação negativa quanto aos impactos ecossistêmicos das represas.

Nas situações em que foram realizadas análises de impactos ambientais antes da construção, a CMR identificou que a grande maioria dos projetos apresentou um percentual elevado de impactos não previstos e de medidas mitigadoras que não obtiveram os efeitos desejados. Parte desses fracassos são decorrentes da ausência de informações básicas adequadas, parte a práticas inadequadas de importação de tecnologias e parte a incertezas inerentes à complexidade das interações existentes nos sistemas ecológicos. Por outro lado, o documento expressa uma tendência de aprofundamento dos estudos necessários para o licenciamento de empreendimentos.

No Brasil, esta tendência inicia com iniciativas do próprio setor elétrico, que foi durante muitos anos dominante no controle da gestão dos recursos hídricos. Posteriormente, com a criação do Sistema Nacional de Meio Ambiente, consolidado em dispositivos constitucionais em 1988, iniciou-se um processo de crescente aperfeiçoamento na análise de impactos ambientais de represas no Brasil. A Constituição definiu como unidade de planejamento dos recursos hídricos as bacias hidrográficas.

No entanto, o sistema de licenciamento vigente no Brasil é do tipo pontual. Embora as normas existentes exijam definições de áreas de influência direta e indireta dos empreendimentos, não deixa clara a incorporação dos efeitos cumulativos de diversos empreendimentos dentro do mesmo sistema hidrográfico.

Recentemente, esta tendência começou a ser incluída entre os objetivos do licenciamento ambiental. No Rio Grande do Sul, o primeiro estudo elaborado para definição de critérios de licenciamento de represas com base em uma visão de gestão de bacia hidrográfica foi conduzido pela FEPAM para a bacia hidrográfica do Taquari-Antas (BECKER & GUADAGNIN, 2001). Neste trabalho, os autores propuseram uma metodologia para análise de criticidade de trechos de rios bem como incluíram critérios de conectividade e fragmentação florestal para definição de orientações para o licenciamento de barragens em escala de bacia hidrográfica. A fim de mitigar os efeitos cumulativos de barramentos no mesmo sistema, os autores propuseram a classificação dos trechos de rios por tipologia e a definição de pelo menos um trecho de cada tipologia livre de barragens na bacia hidrográfica, bem como uma distância mínima de trecho livre de barramentos entre empreendimentos.

Assim, o estudo de BECKER & GUADAGNIN (2001) representa o ponto de partida, do ponto de vista metodológico, para este trabalho. No entanto, aqui não se pretende unicamente estabelecer critérios genéricos de licenciamento de represas nas áreas de estudo propostas para os diferentes temas abordados, mas propor uma abordagem de licenciamento que funcione como um sistema de apoio à tomada de decisões, onde os critérios correspondentes à escala de bacia hidrográfica e aqueles específicos da escala local do empreendimento sejam incorporados em uma rotina hierárquica de tomada de decisões, da escala regional para a local, ou seja, do geral para o específico.

O licenciamento ambiental não é um produto, mas sim um processo. Um processo que deve ser planejado e otimizado com o auxílio dos sistemas de informações de suporte à decisão.

De acordo com ROBERTO (2000), o Sistema de Informação é o processo de transformação de dados em informações que são utilizadas na estrutura decisória da organização, além de proporcionar a sustentação da gestão para otimizar os resultados esperados. "São sistemas abertos, que interagem com um ambiente dinâmico, envolvendo variáveis como pessoas, equipamentos e programas".

Assim, os Sistemas de Informação de suporte à decisão são conjuntos de componentes inter-relacionados que possuem funções de recolher, processar, armazenar e distribuir informações para a tomada de decisões. "Na realidade, a sua característica deve ser a de uma ferramenta aberta, ou seja, ser antes de tudo prática, acessível e facilmente submetida a tantas mudanças quanto necessárias. O desenvolvimento de um Sistema de Informação deve estar perfeitamente integrado com o planejamento de uma organização para que venha a contribuir para a conquista dos objetivos globais" (ROBERTO, 2000).

Desse modo, o sistema de informações proposto incorporou essa visão completa da tecnologia de informação, sendo desenhado a partir da visão estratégica da atividade de licenciamento ambiental, considerando os objetivos de planejamento e gestão ambiental de bacias hidrográficas.